Herdade da Malhadinha Nova
Evasão

É maravilhosa a Herdade da Malhadinha Nova

Alguns recantos são mais especiais do que outros e, no que à hospitalidade diz respeito, pode ter-se a melhor arquitectura rodeada de natureza pura, o luxo certo nos detalhes, bons restaurantes, vinho de excelência e um serviço impecável, mas é a alma do lugar que nos faz voltar. Este é um desses raros donde não se quer sair - e até as cegonhas vão para lá viver.

A Herdade da Malhadinha Nova parece ter tudo: terras a perder de vista, uma planície alentejana dourada onde as casas parecem pousar, dois restaurantes para todas as ocasiões e vinhos óptimos de produção própria. Em vez de corrermos sempre para as praias, devíamos prestar mais atenção ao belo interior do país. Porque não Albernoa, ao pé de Beja?

A família Soares é distribuidora de vinho e têm uma grande garrafeira, no Algarve, onde vivem. Começaram a “apaixonar-se pela produção”, conta-nos Rita Soares. “O meu marido tinha o sonho de ter uma quinta com animais, ele é do Ribatejo”. Ela é de Lisboa e sempre gostou da ideia. Rita fez a Escola Superior João de Deus, gosta “muito de crianças e de criar”, o marido estudou Economia - e o cunhado, sócio da vida, escolheu Gestão. Namoraram desde os 16 anos e tiveram quatro filhos

A família queria um espaço para passar o fim de semana, mas não encontraram nada que os arrebatasse na sua zona até que encontraram estas terras abandonadas, há mais de 30 anos, “terras incultas e sem água, todas as casas em ruínas”, conta-nos Rita enquanto batemos de Defender o terreno. Em 1998, compraram-nas. Começaram com apenas dois trabalhadores, hoje são mais de 70, quase todos alentejanos da zona. “Sei o nome das pessoas todas”.

Um exemplo de sustentabilidade

Fizeram um projeto intervenção no espaço rural “muito detalhado, com características endógenas e os edifícios de interesse regional a preservar dentro da propriedade”. E tendo em conta as várias medidas de proteção, do leito da Ribeira à avifauna. “Sei minuciosamente qual o solo de cada canto da propriedade”, diz-nos Rita Soares. “Foi tudo tão espontâneo”. Cedo trouxeram o enólogo da Herdade do Esporão, Luís Duarte, “que nos inspirou, assim como os produtores já estabelecidos, a Cartuxa ou João Portugal Ramos.” A ideia sempre foi rodearem-se de “bons técnicos”, afirma Rita, “queremos muito aprender e trabalhar com equipas profissionais e fazer bem feito.”

A Herdade da Malhadinha Nova foi primeira a entrar no programa de sustentabilidade de vinhos do Alentejo, pioneiro no país, criam os seus próprios animais, fazerem o seu próprio azeite, mel, farinhas. Têm certificação biológica antes do tema estar, e muito bem, na ordem do dia. Um “espírito muito perfeccionista em relação ao ambiente”, quiseram “ser exemplo de boas práticas”, diz-nos Rita. E não param de receber prémios de sustentabilidade, mas também da melhor escapada internacional da Condé Nast Traveler ou de melhor enoturismo no prémio nacional para o turismo de vinhos, da Apeno - Associação Portuguesa de Enoturismo.

A propriedade está inserida na “Rede Natura 2000“ da UNESCO, por isso ali são protegidas espécies como a abetarda, o cisão ou o peneireiro das Torres, e as práticas agrícolas e de bem-estar animal são todas levadas à risca. As hortas da Malhadinha são classificadas e estão a ser completamente recuperadas. São também auto-suficientes na produção de azeite e mel feito a partir de plantas espontâneas, como o eucalipto e o rosmaninho, e ainda farinha, trigo barbela e centeio.

A Malhadinha Nova nunca foi explorada de forma exaustiva, nem adubada quimicamente, por isso a sua produção é biológica, as árvores autóctones são protegias, assim como os pomares já existentes, a água é toda reutilizada, tratada e aquecida em caldeiras com lenha da limpeza dos terrenos, por exemplo. Não é exagero: a Malhadinha é uma espécie de paraíso na Terra.

Onde ficar

Em 2008 contruíram o Monte da Peceguina, a casa original, que dá nome a um dos seus vinhos mais conhecidos. Construída a partir da ruína de uma hospedagem com mais de 100 anos, que recebia os viajantes que faziam o percurso Lisboa-Faro a cavalo, é a primeira aventura da família Soares na hospitalidade. E é um encantador clássico com 10 quartos, sete duplos e duas suites, rico em áreas comuns, muito aconchegante, com a cozinha aberta para a sala, que dá para uma bonita esplanada, por sua vez aberta à planície. Ali fazem-se belos churrascos e trabalha Vitalina, que cuida dos almoços desde o primeiro dia. “Ainda não haviam chefs, e eu estava sozinha na cozinha”, conta-nos. “Ainda não existia hotel, vi todos os filhos de Rita nascer.”

Em 2019 inicia-se uma nova fase e a Herdade dá o salto para a hospitalidade de luxo. Hoje enche-se de turistas americanos e brasileiros, mas Rita fez questão de manter a Peceguina a preços “dos clientes de sempre”, devia ser sempre assim. “Alguns vêm visitar-nos muitas vezes por ano.”

Dantes barcos ancoravam perto donde agora é a Casa do Ancoradouro, mas a família Soares só encontrou ruínas onde o gado passou a pastar. Como tinha um pombal, Rita quis manter na decoração a presença da madeira, dos tons terracota, barro e argila, e pequenos nichos nos terraços dos quartos que albergam vasos feitos por um artesão local. Também oferece serviço de cozinha, tomámos lá um pequeno-almoço delicioso, e é o ponto mais alto da propriedade, dali avista-se as planícies a perdem-se de vista. Ao fim da tarde um jovem pianista de Beja toca no piano Steinway de 1900 e os hóspedes saboreiam os vinhos da herdade antes do jantar.

As suites da Casa das Pedras são villas belíssimas com piscina, e quartos lindos e cheios de luz com terraço para a vinha e piscinas privadas aquecidas. Era um antigo moinho e casas de utensílios rurais, e rompem completamente com a arquitetura tradicional, é betão que parece madeira e patrece ter brotado ali na paisagem: “Pedi à arquitecta para que o cliente sentisse estar a dormir  num fardo de palha”.

A Casa das Artes e Ofícios recupera o espírito das casas da aldeia e artesanato da região, em tempos ali o povo lavava a roupa. É inspirado pela água, em belos tons verde, Rita pediu mesmo um Pantone especial de cor. Vêem-se cadeiras pé de galo ao lado de cadeiras Aalto, “uma combinação entre o passado e o presente”, que está um pouco por toda a propriedade, mas aqui é mais evidente. ”Não há nada que eu não tenha escolhido, do vaso à almofada, não estudei decoração, mas interessei-me”, diz-nos Rita que pensou todo o conceito desta e das outras casas, “fui investigando”, diz, e nota-se. Mistura peças de design com móveis vintage recuperados ou achados de antiquários e lojas de velharias em Borba, com peças de mestres locais que ela apoia: “Sou embaixadora dos mestres daqui, gosto muito de pessoas.”

“Sempre quis fazer a decoração porque não há quem conheça melhor este lugar. E apostei sempre em qualidade, coisas caras, não pelas marcas, mas se se quer um hotel para ficar para a vida inteira… Há 15 anos que não mudo um candeeiro.” Por todo o lado as jarras enchem-se de flores nos corredores, nos quartos, nas casas de banho: “Este é um sítio de natureza, temos de deixá-la entrar em casa”, diz-nos Rita. Por isso escolhe cada jarra e cada molho de flores.

Comida é conforto

O pequeno almoço pode ser tomado no quarto, na Peceguina ou no Ancoradouro. Pratos magníficos de frutas bio e de queijos da região, bolas e brioches feitos na cozinha, croissants óptimos e pão tradicional da zona, compotas bio e uma lista de ovos para todas as vontades. Destaque para os ovos Malhadinha escalfados com bacon, cogumelos e aromas alentejanos

O restaurante parece um aquário, em madeiras claras, por onde entra a luz do dia, e é magnífico jantar ali no verão, com os tons do Alentejo a desaparecerem e os pavões a exibirem-se por perto. É tudo super cuidado e competente, do pão caseiro com manteiga dos Açores e flor de sal de vinho tinto, o presunto para negra e queijo de Serpa e o azeite muito suave da Malhadinha que abrem as hostes. Das entradas, gostámos particularmente dos legumes biológicos da estufa, com vinagrete de tomate verde e laranja, do tártaro de atum com centeio bio, beterraba e alperce e do camarão do Algarve com carpaccio de tomate coração, meloa, berbigão e maionese de limão. E ficamos a pensar no ovo biológico com espinafres e batata doce em crosta de pão alentejano.

Dos pratos, destacamos os arrozes – há um de abóbora que é demais – o peixe de anzol da costa algarvia com arroz cremoso e algas da ria Formosa e os pratos de carne proveniente da criação da herdade. A rematar, elegeríamos a mousse de morango e chocolate branco, suspiro de hortelã, meloa macerada com late harvest, gelado de meloa, hortelã e gel de tangerina. Tudo regado por um rosé, jovem e fresco e depois Antão Vaz da Peceguina, e um Malhadinha, branco de quatro castas, Arinto, Álvarinho, Viosinho e Chardonnay. A adega da Malhadinha é junto ao restaurante, fazem-se provas com o Martim que são lições de vinhos que davam para outro artigo.

Podemos ainda mencionar que as hortas da Malhadinha são classificadas e estão a ser completamente recuperadas, e são auto-suficientes na produção de azeite e mel feito a partir de plantas espontâneas, como o eucalipto e o rosmaninho, e ainda farinha, trigo barbela e centeio.

Vem aí o spa

Podem fazer-se mil coisas na Malhadinha, passeios a cavalo, leves piqueniques nas vinhas, e na rentrée estará completa a recuperação do spa feita pelo arquitecto Manuel Aires Mateus: três salas com banheira de vinoterapia, tratamentos de argila e com cosméticos açorianos da Ignae, uma sauna e um centro de massagens ao ar livre.

Quando nos sentamos com Rita Soares depois do périplo pela herdade que durou todo o dia, tudo se conclui num pôr do sol. “Sabe, aqui as pessoas não compram uma casa ou um quarto, mas uma forma de estar”, e pensamos que não queremos nada voltar a Lisboa. Atrás de nós há um grande ninho de cegonhas, há muitos por toda a Malhadinha, o que diz muito sobre este lugar. Observamos dos quartos os pais a cuidarem das crias que nasceram na primavera.“Há ninhos para todos aqui”, comentamos. Rita devolve o sorriso: ”Há ninhos para todos aqui.”

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