Na matemática do luxo, os números são apenas um detalhe. O que importa é o desejo, a emoção... a mise-en-scène. E, claro, a embalagem. Quando a Flakes aproveitou o hype dos últimos tempos e lançou o Ovo de Chocolate do Dubai — sim, aquele com ouro comestível, a preço de joalharia (cerca de €700) — as redes sociais fizeram deste doce um fenómeno.
Mas, atenção, o mais impetuoso dos desejos não vive de momentos...
E a Louis Vuitton sabe disso. Para esta quadra pascal, “o Chocolate Egg Bag”, uma colaboração entre a maison e o Chef pasteleiro Maxime Frédéric, chega-nos como uma réplica comestível da icónica bolsa desenhada por Nicolas Ghesquière para o desfile primavera-verão de 2019. Com um preço de €225, esta criação posiciona-se como uma alternativa luxuosa e indulgente aos tradicionais ovos de chocolate.
Um produto previsivelmente doce, mas, convenhamos, este ovo tem tanto de Páscoa quanto um desfile de Alta-costura tem de brunch campestre. O chocolate que parece couro, com o monograma e uma estrutura rígida, não pretende ser comido. Pretende ser fotografado, desejado, disputado. E, se possível, compreendido — embora isso já exija um outro tipo de digestão.
Talvez o chocolate do Dubai vença no critério do grama por euro, mas perde para o mais relevante da indústria: o da narrativa.
Ouro comestível soa a pouco quando pensamos num objeto Louis Vuitton com valor simbólico, histórico e (quase) funcional? Afinal, há algo mais deliciosamente irónico do que pagar por um ovo que não se quer comer, mas que pode muito bem ser o centro da mesa, da conversa e da próxima exposição do V&A?
Não é de agora que o luxo deixou de ser sobre utilidade. O inútil sublime é, há muito, a linguagem oficial das maisons. Uma bolsa em forma de barco? Um casaco que não aquece? Um ovo de chocolate que se quer levar ao ombro? Sim, sim e sim. A função tornou-se secundária; o gesto, a ideia, o conceito — esses são os novos pilares do desejo. A Louis Vuitton sabe disso como ninguém. E se o ovo serve ou não para guardar qualquer coisa além de significado, é irrelevante.
A verdade é que este Egg Bag é uma provocação disfarçada. Uma piscar de olho à iconografia religiosa da Páscoa, mas com o espírito de um desfile em Paris. Não se trata de chocolate — trata-se mais de identidade. De legado. De poder simbólico. Um ovo que não se derrete ao sol do Dubai, que não acaba depois da última dentada, que não precisa de uma moda passageira porque já nasce eterno. Demasiado poético? Merece.
Claro que o ovo do Dubai brilha. Literalmente. Tem ouro, tem hype, tem a estética maximalista que o algoritmo tanto ama. Mas não será apenas mais um meme comestível condenado ao esquecimento digital?
A Louis Vuitton, com o seu ovo impraticável, oferece uma alternativa: um luxo que não precisa de justificar o preço com ingredientes raros ou quilates comestíveis. Um luxo que é apenas… luxo. Um lembrete de que, no grande teatro da moda, o aplauso final não vai necessariamente para quem brilha mais, mas para quem melhor entende o papel que representa.
Se, no final, a conta for mais alta por um ovo que não se come — que seja. O preço é apenas uma nota de rodapé na história de quem sabe que o verdadeiro sabor do luxo está naquilo que ninguém mais consegue (ou tenta) oferecer.