Philippe Starck o designer da nova máquina Delta Q RISE
Design e Artes

conVERSA com Philippe Starck

Sobre o inútil. O desafio a Einstein. A doença chamada criatividade.

E chega o dia em que tenho a oportunidade de conversar com Philippe Starck. Um nome que dispensa apresentações, um dos mais brilhantes designers contemporâneos e que, confesso, estava na minha wishlist. A Starck apetece fazer aquele exercício simplista de lhe chamar apenas Star(ck), obviamente por ser uma estrela do design, mas porque há também nele uma outra dimensão: a paixão pelo Espaço; a sua admiração pelos astronautas “pessoas diferentes que passam meses a olhar para a Terra e a pensar coisas que nós não percebemos ainda, são pessoas mágicas”; os projetos que já desenvolveu com agências espaciais, o pai que foi dono de uma companhia aérea; o próprio Starck já foi piloto e até tem o descaramento (com humor) de dizer “Ei Einstein, pensa duas vezes”.

Foi escolhido para curador e designer da nova máquina Delta Q RISE, que incorpora um revolucionário sistema de extração de café invertido, uma inovação tecnológica que desafia a gravidade. Um café expresso “perfeitamente ao contrário”, que é isso mesmo, através do sistema de extração, o café é injetado debaixo para cima, pelo fundo da chávena, o que intensifica o paladar e os aromas naturais do café. Um desafio à ordem natural das coisas e por onde começa esta conversa, sem guião, e sobre tantas outras coisas.

  • Como foi o processo criativo para o design desta máquina que desafia a gravidade?

Há pessoas úteis e pessoas inúteis. As úteis são as que criam vida ou que podem salvar vidas, eu sou inútil porque quando muito tento proporcionar uma vida melhor. É completamente inútil, mas tento fazê-lo da melhor forma possível, e uma das minhas tentativas é fazer de mente aberta e trazer surpresas férteis, ou seja, usar tudo para criar situações abnormais. Neste caso é imaginar uma manhã, mais um novo dia, que não é muito divertido e ao preparar o nosso café, de repente, o café surge de forma inversa, de baixo para cima. E é interessante porque não estamos habituados, aqui invertemos a gravidade. Adoro a ideia de manter a tensão, a criatividade, de tentar dar às pessoas uma vida com mais brilho, mais criatividade, mais apaixonante. O meu trabalho é tentar a cada oportunidade, até numa simples máquina de café, trazer um novo ângulo.

  • E há poesia em pensar o mundo ao contrário? Ou apenas inovação?

É pura poesia! Para mim poesia é ciência e aqui até pode parecer uma piada, mas Einstein disse que as únicas coisas que existem é a gravidade e o tempo. Nós com esta máquina de café invertemos a gravidade e dizemos: “Ei Einstein pensa duas vezes!”.

  • Vive no futuro ou mais no presente?

O futuro é a minha vida, falo de criatividade e não de qualidade, mas a criatividade ao meu nível significa no mínimo um grande projeto por dia. É doentio, nascemos com ela e morremos com ela. E toda a minha vida é no futuro. Eu não tenho vida. Não sei o que é ter vida pessoal ou privada. Para ser honesto não estou interessado na vida real, mas antes nos meus sonhos.

  • Como é viver consigo próprio, com essa cabeça criativa. Too crazy or too cool?

Não é cool, não é divertido, é viver algures … É aparecer em frente à tua família como um fantasma, não falamos e vivemos numa espécie de mundo frenético onde existem apenas os teus projetos e só isso. Felizmente trabalho uma média de 250 projetos por ano que me dá diversidade. Seria impossível passar um ano com o mesmo projeto, acho aborrecido, demasiado obsessivo. Gosto de saltar de um sonho, para outro sonho, e daí para outro sonho, ser multidirecional.

 

O designer assume-se como um militante contra tendências. Olha para elas como um assusto económico completamente obsoleto quando o mundo se devia preocupar em comprar menos e pensar em temas como longevidade e herança. “Tendências? Para mim é uma grande falta de respeito”. E entre a sua vida ou os seus sonhos, há dois novos lugares que o fazem pensar. “Nós já estamos a preparar projetos no Metaverso, é um mundo que é a extensão do nosso próprio mundo” adianta. E depois há Portugal. De resto, um dos motivos por ter aceitado este desafio da Delta foi precisamente sentir quem tem uma “dívida” para com o país, que o recebeu e o ensinou a exprimir-se com abraços.

  • O que já tem de português em si?

Nós já somos portugueses, quando chego ao aeroporto e toco no chão penso…Home. Quando estou no Guincho e vejo o Cabo da Roca, as ondas, o pôr do sol, na minha terra, sinto que esta é a minha casa. E é muito raro para mim, é provavelmente a primeira vez que tenho esta sensação. Viajei toda a minha vida, desde os meus 20 anos sou um apátrida e, pela primeira vez, e por causa dos portugueses, sinto-me em casa.

Confesso que ficaria várias horas à conversa Philippe Starck. Revelou-se ainda mais cool do que o cool que sempre pareceu. Fechei o encontro com uma história pessoal (senti que a conversa o permitia…) e contei-lhe que na Indonésia, num campo de arroz, me perguntaram “quem és?”, ao que respondi “sou uma jornalista, trabalho há 20 anos em televisão…”, e essa mesma pessoa respondeu: “Sim, mas quem és tu?”. E expliquei ao designer: “Foi o momento em que percebi que a minha profissão não me define.” E quem é o Philippe Starck para além do génio do design que todos conhecemos, perguntei-lhe: “Sou alguém com uma doença mental e que vive sozinho nos seus sonhos, tento ajudar a minha comunidade a ter uma vida melhor. Sou um explorador, exploro tudo o que posso e mentalmente estou sempre a sonhar” disse sem hesitar.

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