Quem visita o Cavalariça, em Évora, e já conhece os outros restaurantes do grupo (Cavalariça, na Comporta, e Cav86, em Lisboa), depara-se com uma cozinha de mercado em que o menu é ditado pelo que os fornecedores nas proximidades do restaurante têm disponível. Esta aposta em criar uma rede de confiança com produtores locais de qualidade é um dos traços característicos de Bruno Caseiro desde que abriu o primeiro Cavalariça há quase dez anos na Comporta, mas muita coisa mudou no universo Cavalariça desde então: o restaurante que ocupa desde 2022 parte do Palácio dos Duques de Cadaval, no centro da cidade alentejana, ao lado do Templo de Diana, mantém-se fiel aos pilares do grupo de dar a provar os melhores produtos da temporada, mas aposta em pratos para partilhar com técnicas mais elaboradas, sem nunca nos fazer esquecer que estamos no Alentejo.
A chilena Catalina Viveros, sub-chef executiva do grupo, é quem nos recebe numa tarde de julho em que a canícula alentejana não dá tréguas. A ideia de almoçar no jardim projetado pelo paisagista francês Louis Benech, que lembra os típicos pátios andaluzes, rapidamente cai por terra. No interior do restaurante, as paredes pintadas pela artista sul-africana Esther Mahlangu levam-nos numa viagem pela tribo Ndebele com as suas cores vivas e padrões uniformes. “Para nós é um orgulho termos alguns produtos que sabemos que não vão estar noutros sítios”, diz, com entusiasmo, Catalina, enquanto serve numa pequena taça um fio do azeite Amor é Cego, “um projeto muito pessoal de João Rosado a mais ou menos 20 minutos daqui”, que recuperou oliveiras centenárias num terreno de família.
Com o azeite produzido a partir de azeitona galega, mais picante e com um aroma pronunciado, chega à mesa um pão branco alentejano de trigo que poucas vezes se prova em restaurantes do mesmo segmento. São “as entradinhas, como num típico restaurante alentejano”, diz Catalina. O pão de centeio, feito também no restaurante, assemelha-se a uma broa, e é nele que barramos uma manteiga produzida a partir de soro de leite e fermentada durante uma semana. A maioria dos produtos são de origem biológica, “desde a farinha até aos vegetais e azeites”, refere com orgulho Catalina Viveros. “Fizemos um trabalho de investigação para os melhores fornecedores que queríamos que representassem a zona.”
Um dos pratos mais conhecidos do restaurante de Évora, e que não se encontra nos outros espaços do grupo, é o coelho de escabeche acompanhado por um flatbread de trigo (€7,5), que parece uma tortilha mexicana. A inspiração vem do coelho à São Cristóvão e come-se como um taco. Sem nunca sairmos do Alentejo, o rissol de raia “inspira-se na sopa de cação”, e é acompanhado por uma maionese de ostra, exemplifica a chef chilena, antes de nos trazer um bife de tomate grelhado “como se de carne se tratasse”. Este é um dos pratos que também se pode provar na Comporta, embora com outros elementos. Em Évora, o tomate coração de boi é grelhado e tem na base um puré com beringela fumada, croutons e ervas aromáticas (€16).
“Temos alguns pratos que são iguais [nos outros restaurantes] e outros que aproveitam a base”, afirma Catalina. “Queremos que os clientes sintam a nossa marca, que estão na Cavalariça.” Um dos novos pratos de verão é o choco salteado, envolto num molho fumado da sua tinta, acompanhado por batata nova ao sal (€19,5), que parece um tagliatelli. “O restaurante na Comporta é mais de praia. Cá, nós tentamos fazer uma coisa um pouco com mais cuidado nos pratos. Os pratos são mais pequeninos e para partilhar”, diz. Num cruzamento entre a América Latina e o Alentejo, a pluma de porco, traz-nos de volta às planícies da região, onde o animal que nos chega ao prato foi alimentado exclusivamente a bolotas. A pluma é grelhada e acompanhada por um mole feito à base de malaguetas, pimentas e outras especiarias e uma salada de alface grelhada temperada com caldo da pluma.
Uma das sobremesas que provamos surgiu depois de uma visita de Bruno Caseiro ao produtor de vinhos Joaquim Arnaud, que serviu ao chef uma laranja às rodelas com azeite e sal, tal como se fazia nas casas das famílias alentejanas mais humildes no passado. É daí que nasce a torta de citrinos com gelado de camomila e mel, uma das quatro sobremesas disponíveis, e que nos faz ter a certeza que no Cavalariça de Évora se faz cozinha alentejana, com produtos da região, sem preconceitos.