A saúde mental é, hoje, um dos maiores desafios de saúde pública em Portugal. Ao abordarmos este tema, é fundamental perceber que é algo que vai muito além de diagnósticos clínicos ou perturbações complexas, como a esquizofrenia ou outros transtornos.
Falar sobre saúde mental não é apenas falar sobre a ausência de perturbações, é falar sobre o bem-estar, a nossa capacidade de adaptação, de viver em equilíbrio, de enfrentar os desafios do quotidiano, é falar sobre manter a esperança.
No entanto, este continua a ser um tema envolvido em silêncios, preconceitos e desigualdades. No Dia Mundial da Saúde Mental, que se assinala hoje, temos a oportunidade, e sobretudo a responsabilidade, de encarar esta realidade e assumir a urgência de colocar a saúde mental no centro das políticas de saúde e das prioridades sociais.
De acordo com a Ordem dos Psicólogos Portugueses, 22% da população apresenta problemas de saúde mental, um valor acima da média da União Europeia: 16,7%. Deste total, cerca de 4% correspondem a doenças mentais graves, que exigem acompanhamento especializado contínuo. As perturbações psiquiátricas são responsáveis por cerca de 12% da carga global de doença, um indicador que considera não só as mortes prematuras, mas também os anos vividos com incapacidade, o que evidencia o impacto não só na vida das pessoas e famílias, mas também no sistema de saúde e na economia. Por si só, estes dados deveriam ser mais do que suficientes para mobilizar um debate nacional sério e sustentado sobre saúde mental.
A realidade, porém, está longe de corresponder às expectativas. Persistem desigualdades regionais, tempos de espera demasiado longos e escassez de profissionais especializados.
Paralelamente, e igualmente preocupante, o estigma continua a afastar muitos da procura de ajuda, atrasando diagnósticos e agravando doenças. O resultado é um ciclo de sofrimento, exclusão social e perda de qualidade de vida, que poderia ser interrompido com a prevenção, diagnóstico precoce e tratamento adequado.
A saúde mental não diz respeito apenas a quem vive com uma perturbação ou transtorno.
Atinge familiares e cuidadores que têm de enfrentar desgaste emocional, isolamento e falta de apoio, o que reforça a necessidade de respostas integradas que apoiem toda a rede social.
Para resolver este problema, é indispensável investir em recursos concretos: mais psicólogos e psiquiatras, equipas multidisciplinares que integrem diferentes níveis de cuidados, programas comunitários próximos das pessoas e respostas acessíveis em todo o território. Só assim a prevenção será eficaz, o diagnóstico poderá ser feito atempadamente e os tratamentos terão impacto real na vida das pessoas. Sem estas condições, a saúde mental continuará a ser um direito adiado para muitos.
A saúde mental não é uma questão secundária nem um luxo: é um direito essencial à qualidade de vida e à coesão social. Cada estatística representa uma vida, representa uma história que não pode ser ignorada. Neste Mês da Saúde Mental, lanço um desafio: que a saúde mental deixe de ser apenas tema de ‘discursos’ e se transforme numa prioridade de ação concreta. Porque cuidar da saúde mental é cuidar das pessoas, das famílias e do futuro de Portugal.
